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Sejam bem-vindos (as)! Vamos criar interrogações, incentivar a leitura, instigar o pensar, espalhar sementes...

quarta-feira, 29 de junho de 2011

Vagabundos, não senhor!

“O que me surpreende na aplicação de uma educação libertadora é o medo da liberdade” (Paulo Freire)


Olá!
          Hoje falo do lançamento de um livro que tem muito a ver comigo, e com este blog  Mire e Veja Travessia, que tem compromisso com uma educação libertadora, nem sempre muito fácil, na prática, quando se trilha o caminho da educação convencional na qual estou inserida . Trata-se de “Vagabundos, não senhor – Cidadãos brasileiros e planetários!”,  de autoria do meu  amigo, Thierry De Burghgrave.
        Com muita honra e alegria recebi o livro em casa, com uma bonita dedicatória, e ao lê-lo fiz uma “viagem” histórica, prazerosa e enriquecedora, e em vários momentos dispus de muita emoção “vendo”, por onde, de certa forma, já passei. 
       Pode-se constatar que o livro é “um misto de ensaio científico e autobiografia”. Aborda “os caminhos de uma educação libertadora, através da maravilhosa  aventura que foi a implantação e efetivação da Escola Comunidade Rural na região de Brotas de Macaúbas, na Bahia, embora abordando também o trabalho da Pedagogia da Alternância no Brasil e o mundo.”
        Não quero tecer comentários sobre o livro para preservar  a curiosidade e o julgamentos de quem vai ler, uma vez que o mesmo foi lançado há menos de um mês. Registro, porém, que me surpreendi positivamente. Não podia esperar menos quando  se trata de uma pessoa com autoridade para discorrer  sobre esse e outros temas, o que, certamente, foi um ponto decisivo para a qualidade da obra como um todo.
Thierry (foto), Mestre em Ciências da Educação, educador, tradutor de artigos, livros, atualmente é assessor da UNEFAB (União Nacional das Escolas Famílias Agrícolas do Brasil). Um voluntário da cooperação belga que chegou ao Brasil, jovem, cheio de ideias, e abraçou a luta pela educação onde trabalhou , inclusive, divulgando a Pedagogia da Alternância em várias regiões brasileiras , onde se tornou uma pessoa muito querida e admirada. “Sou um brasileiro com sotaque belga”, assim ele se autodenomina.
        Seu livro vem como um presente para todos nós, seus amigos, e todos aqueles que desejam ter um melhor conhecimento sobre o autor, e temas relacionados a Educação Libertadora, Pedagogia da Alternância, Educação no Campo, Conflitos de Terra, “ Fundo de Pasto”, Fundação da ECR em Brotas de Macaúbas, dentre outros. Trata-se, portando, de um livro direcionado a um público, de certo modo, mais específico, que eu espero, tenha acesso e leia o livro.
        Concluo parafraseando (quase copiando) Dom Luiz Cappio, no prefácio do livro: Obrigada, por esta viagem no tempo. Obrigada, por este alimento de testemunho de lutas, conquistas, por  acreditar que “um novo mundo é possível” desde que se dê a vida, com inteligência, criatividade, mas com muito amor e compromisso com os menos favorecidos, que são os prediletos de Jesus e que, por consequência, devem ser o nosso também. Obrigada por nos confirmar que sem grandes ideais e sem esperança não se alcança uma sociedade justa e fraterna.
     

 Parabéns! E que venha o próximo livro.

* foto 2: capa do livro.

domingo, 19 de junho de 2011

Rubem Alves: Papos e Ideias

“A nada e a ninguém serás fiel, se não fores fiel a ti mesmo” (Dom Hélder Câmara)

          Olá, queridos e queridas!

        Quem me acompanha aqui no Mire e Veja Travessia já sabe que sou admiradora de Rubem Alves, renomado educador, escritor, psicanalista e grande ser humano. Tenho algumas postagens nesse blog que se referem a textos dele, e outras postagens certamente virão, pois aqui é um espaço para “criar interrogações, incentivar a leitura, instigar o pensar, tomar posição, espalhar sementes...” E os textos de Rubem Alves fazem isso.
         Nessa semana tive a oportunidade e a honra de “prosear" um pouquinho com Rubem Alves num evento promovido pela Livraria Saraiva - Papos e Ideias - para publicação do livro “O ALUNO, O PROFESSOR, A ESCOLA – uma conversa sobre educação” , da Editora Papiros, em parceria com outro grande educador e escritor: Celso Antunes, de quem também tenho e já li vários livros, dentre eles, os da coleção “Fascículo na sala de aula – Ed. Vozes”.  Algumas coisas ficaram por debater e muitas perguntas por fazer, até porque não se pode “roubar” o tempo das outras pessoas presentes que também querem e precisam se manifestar. Fiquei  feliz, principalmente, por  expressar minha ENORME GRATIDÃO ao Mestre Rubem Alves que sempre me influenciou com suas excelentes reflexões sobre educação, religião, política, e vários aspectos da vida do ser humano por meio das suas entrevistas, artigos em jornais e, principalmente, em seus livros. Falo que os seus livros são escritos em prosa e cheio de poesia. Sua vida, seus escritos são encanto para nossa alma e alimento para a nossa utopia, para a nossa vida.


        Um dia marcante para mim!Compartilho com vocês esse momento e deixo um pequeno texto de Rubem Alves para saborearmos e refletirmos.
  Crédito da foto 1: Professor Arilton
  Crédito das fots 2 e 3: Paulo Guimarães - Saraiva                          

*********

Há escolas que são gaiolas. Há escolas que são asas
Escolas que são gaiolas existem para que os pássaros desaprendam a arte do voo. Pássaros engaiolados são pássaros sob controle. Engaiolados, o seu dono pode levá-los para onde quiser. Pássaros engaiolados sempre têm um dono. Deixaram de ser pássaros. Porque a essência dos pássaros é o voo.
Escolas que são asas não amam pássaros engaiolados. O que elas amam são os pássaros em voo. Existem para dar aos pássaros coragem para voar. Ensinar o voo, isso elas não podem fazer, porque o voo já nasce dentro dos pássaros. O voo não pode ser ensinado. Só pode ser encorajado. (Rubem Alves)


segunda-feira, 13 de junho de 2011

Quando a gente ama

"A coisa mais fina do mundo é o sentimento" (Adélia Prado)


          Ano passado ao trabalhar na escola um projeto interdisciplinar, na semana dos namorados, li um texto - O Amor - de Carlos Drummond de Andrade. Os alunos/as adoraram (até o publiquei aqui no Mire e Veja Travessia). Esse tema e a data de ontem são bem típicos dessa fase   e eu que há muitos anos trabalho com essa querida gente, jovens e adolescentes, ouço-os falar das suas vivências e angústias com os namorados/ namoradas, ou simplesmente, “ficantes”. E  “fico”, na maioria das vezes, estarrecida. Pergunto-me sempre se não falta certa dose de ternura...
          Bom! Essa música me chama atenção pela sua singeleza e beleza poética (até convenci meus alunos a cantarem no sarau de 2009, o que foi feito na belíssima voz da Michele do 3º “A” daquele ano).
          Deixo também uma música de Vinícius de Moraes. Leiam (são verdadeiros poemas) e, querendo, ouçam (tem na net). Abraços a todos e todas do Mire e Veja Travessia.

 Quando A Gente Ama - Oswaldo Montenegro
Composição : Marcelo Barbosa Barreti / Nil Bernardes / Fábio Caetano

Quem vai dizer ao coração,
Que a paixão não é loucura
Mesmo que pareça
Insano acreditar...

Me apaixonei por um olhar
Por um gesto de ternura
Mesmo sem palavra
Alguma pra falar

Meu amor,a vida passa num instante
E um instante é muito pouco pra sonhar

Quando a gente ama,
Simplesmente ama
É impossível explicar
Quando a gente ama
Simplesmente ama!

**********

 Pela luz dos olhos teus - Vinícius de Moraes
 Composição: Vinícius de Moraes

Quando a luz dos olhos meus
E a luz dos olhos teus
Resolvem se encontrar
Ai, que bom que isso é, meu Deus
Que frio que me dá
O encontro desse olhar

Mas se a luz dos olhos teus
Resiste aos olhos meus
Só p'ra me provocar
Meu amor, juro por Deus
Me sinto incendiar
Meu amor, juro por Deus
Que a luz dos olhos meus
Já não pode esperar

Quero a luz dos olhos meus
Na luz dos olhos teus
Sem mais lará-lará
Pela luz dos olhos teus
Eu acho, meu amor
E só se pode achar
Que a luz dos olhos meus
Precisa se casar.


quarta-feira, 1 de junho de 2011

Palavra de Mestra

“Todo o nosso conhecimento se inicia com sentimentos” (Leonardo da Vince, pensador italiano)



Olá!
Li uma entrevista de Adélia Prado (foto)  e fiquei encantada.
Li o seu mais recente livro A duração do dia – e fiquei mais encantada ainda. É preciso respirar fundo entre uma poesia e outra, tanto é a carga de sentimentos e belezas.
Transcrevo aqui uma poesia e a entrevista, imperdível não só para professores, mas para estudantes, poetas e futuros poetas, e todos que gostam de educação, de poesia, de coisas boas, enfim.       
Oxalá, todos nós, educadores e educadoras, “ouvíssemos”, com muita atenção, as palavras dessa grande mestra.

1. Poesia*

ÍCARO

Caminho sobre o planeta
como os equilibristas em suas bolas gigantes,
não se sai do lugar,
de si mesmo não se pode sair.
Aviões, dirigíveis, saltos de alta montanha
confrangem o coração.
O voo aborta sempre.
Ainda que em chão de lua,
Todo destino é o chão.

*****

2. Entrevista*                     
"Você sente que algo "pede" expressão.
É o momento do trabalho concreto de escrever"

Poeta nasce poeta ou se constrói como poeta?
O poeta, como qualquer outro artista, nasce como nascem os cantores, já de posse do seu dom. O que se constrói nele é a vida, que segue o processo natural em toda pessoa, artista ou não, visando seu amadurecimento. Tal processo se reflete inevitavelmente na obra. Rigorosamente falando, uma oficina literária não “cria” um escritor, mas pode descobri-lo, como uma escola de música descobre um virtuoso. A poesia não é uma descrição de alguma coisa, não é um comentário a respeito de nada. É uma expressão. Toda arte verdadeira só tem um objeto: a poesia. A obra de um artista, quando verdadeira, seja de que arte for, tem o poder de revelar a poesia contida no ser das coisas. Eu não dou conta de pegar o ser de uma rosa, de um rio, de uma passagem, de um rosto. Só quem consegue revelar esse ser das coisas é a arte, que nos mostra a beleza suprema delas.Nesse sentido, a arte me abre para a realidade. A maravilha dela é isso. É uma epifania. Isso em qualquer tipo de arte, como o teatro, a música, o cinema, a dança, a escultura. A poesia é essa radiação que as coisas têm e que é percebida por meio da arte. Essa radiação é como se fosse o brilho da realidade.

Como nasceu sua vontade de escrever? É uma necessidade? Conseguiria viver sem escrever?
Ainda menina, descobri o poder e o prazer da palavra. Escrevo desde os catorze anos, quando fiz meu primeiro soneto. Tudo o que escrevi até Bagagem não tem nenhum valor literário. São coisas que têm importância, para mim, afetiva, de um bom tempo da minha vida. Agora, literatura, a entrega a um processo de escrita torrencial, eu comecei aos quarenta anos. Eu é quem preciso do exercício de escrever. Vejo como um dever, uma fidelidade a Deus que me concede o dom. Qualquer pessoa, e infelizmente isso acontece muito, consegue viver fora de sua vocação, mas, com altíssimo custo para sua saúde e prejuízo para a comunidade humana, porque o exercício do dom é exigência desse mesmo dom.

Como funciona seu processo de escrita? Que tipo de sensação ou vontade vem primeiro no momento da construção de seus poemas?
Você sente que algo “pede” expressão. Então, é o momento do trabalho concreto de escrever, procurar como dizer aquilo que está pedindo expressão. Num primeiro momento, acredito na inspiração. É o estado e fruição poética que determinada coisa lhe provoca, com o desejo imediato de expressar aquilo. É uma necessidade fatal. O segundo,a escrita propriamente, considero momento de enorme prazer e alegria.É uma coisa fantástica escrever, descobrir sua própria voz. Quem escreve sabe disso.

Como foi o aparecimento do seu primeiro livro, Bagagem?
O livro apareceu em 1976. Eu comecei a escrevê-lo por volta de 1973. Meu primeiro livro foi feito num entusiasmo, na felicidade da descoberta.  Emoções para mim inseparáveis da criação, ainda que nascidas, muitas vezes, do sofrimento. E os poemas praticamente irromperam, apareceram cargas e sobrecargas de poemas.Eu escrevia muito nesse período, e quando eu vi que o volume tinha uma unidade, que ele não era apenas uma coleção de poemas, pois tinha uma fala peculiar, dele próprio, entre outros títulos que me ocorreram, Bagagem era o que resumia, para mim, aquilo que não posso deixar ou esquecer em casa. A própria poesia.


Temas relacionados à mulher, à religiosidade, ao amor e ao desejo são predominantes em sua obra. Existem temas que são mais poéticos ou mais líricos que outros? Ou a poesia pode servir “a todas as fomes”?
A poesia não é assunto, não é enredo, não é tema. Poesia é forma, que se utiliza de tudo. Não há temas mais poéticos. O real é o grande tema. E nós temos o real no cotidiano, configurado no amor, na morte, nas virtudes e nas mais diversas paixões que nos habitam. Qualquer coisa é a casa da poesia. Ela alimenta, dá significação, sentido à vida. A poesia pousa onde lhe apraz. Tem o dom de espalhar humanidade.

Existe uma poesia “feminina” e outra “masculina”?
Poesia feminina é uma tristeza tão grande quanto poesia masculina. Como não tem assunto, a poesia também não tem gênero. É hermafrodita. A poesia é fraterna, solidária, chama tudo a um centro humano divino. É sempre comunhão.

O que dá mais trabalho, ficção ou poesia?
Os dois dão a mesma alegria. A ficção tem feitura mais trabalhosa. Se pudesse escolher, seria só poesia.

Quais são os autores decisivos para sua formação literária?
Dos autores do meu curso primário, cito alguns: Olavo Bilac, Cecília Meireles, Martins Fontes, Castro Alves têm minha perene gratidão. Adulta, conheci nossos grandes: Carlos Drummond, Manuel Bandeira, Guimarães Rosa, Clarice Lispector e outros maravilhosos autores, incluindo muitos estrangeiros, foram e são importantes, porque me fazem ver o que é literatura, a diferença crucial entre versos bonitos e um poema verdadeiro.

Em que medida eles foram fundamentais?
Por meio das obras deles eu vi espelhada a minha humanidade. Eu falei: “Sou um igual”. Eu me vi reconhecida, me vi refletida, e eles confirmaram a minha humanidade. Gostam do que eu gosto. Minha felicidade foi imensa. Continuava a escrever, mas enfadara-me do meu próprio tom, haurido de fontes que não a minha. Até que um dia, após a morte de meu pai, começo a escrever incessantemente e percebo uma fala minha, diversa da dos autores que amava. É isso, é a minha fala. Isso me deu um descanso, me deu alegria.

Nossa publicação é voltada a professores de escolas públicas do Brasil. Conte-nos um pouco de sua longa experiência como professora. Sendo poeta e escritora, como lidava com o trabalho de leitura e escrita de seus alunos?
Não tem segredo. Fui professora antes de publicar meu primeiro livro. Se ofereço bons autores aos alunos e os deixo ler sem o castigo de “tirar a mensagem do autor”, descobrirão a maravilha do universo que um livro pode oferecer. A literatura trata da experiência humana.O leitor se apropria do texto porque o texto se torna dele. Se a escola parar de tratar a literatura como matéria de vestibular e incluí-la no feijão com arroz de sua atividade pedagógica, o resto acontecerá sozinho e melhor: sem esforço. E, melhor ainda, com imensa alegria. Acabei de escrever meu segundo livro infantil: Carmela vai à escola. E coincidentemente lá está a melhor resposta que poderia oferecer à sua pergunta.

Os professores que participam da Olimpíada de Língua Portuguesa Escrevendo o Futuro trabalham em sala de aula com a leitura e a escrita de gêneros textuais, entre eles a poesia. Na opinião da senhora, que tipo de postura um professor pode ter na hora de trabalhar poesia com crianças e adolescentes?
A melhor postura é a de mostrar que ele mesmo, professor, ama a leitura, contagiar os alunos através da ficção e da poesia com seu entusiasmo sobre nossa maravilhosa língua portuguesa. Sem isso não tem nem como começar a falar do assunto. Não há congresso pedagógico que dê jeito nessa miséria, professores que se gabam de não gostar de ler. Mas esta entrevista me anima. Há muita gente boa preocupada em melhorar a qualidade da vida e do ensino de nossas crianças. Longa vida aos que levam a sério a tarefa de fazer do nosso país uma nação.

*PRADO, Adélia. A duração de um dia - Editora Record - 2011, pag. 60

*Entrevista concedida a Luiz Henrique Gurgel  da Revista “Na Ponta do Lápis” – uma publicação da Fundação Itaú Social e do MEC – nº 15

*Grifo meu.