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domingo, 17 de fevereiro de 2013

Juventude em foco em 2013

“O tratamento em questão / só tem contra-indicação / a quem tem medo de viver / e prefere permanecer / estagnado”  (Flora Figueiredo, escritora)


       Com a Campanha da Fraternidade e a Jornada Mundial da Juventude (ambas lideradas pela Igreja Católica), a juventude passa a ser o foco das discussões nesse ano de 2013.
A Campanha da Fraternidade traz o tema “Fraternidade e Juventude” e o lema “Eis-me aqui, envia-me” (Is 6,8)
       A Jornada Mundial da Juventude (JMJ), em julho, no Rio de Janeiro, certamente será um grande evento mundial e contará com a presença do novo papa, uma vez que o atual, Bento XVI, renunciará seu cargo em 28/02/2013.
        Eu, que desde a minha juventude fui participante dos movimentos jovens,  agora, com quase vinte anos atuando na educação em São Paulo, convivo diariamente e diretamente com essa gente e sinto-me no dever de engajar nessa discussão.  Vale lembrar que há uma diferença de gerações. Mas o intercâmbio diário faz com que aconteça uma troca de aprendizagens, de maturidade e jovialidade muito significativa.
       Existem os confrontos, os choques de ideias, de gostos culturais, etc. Valho-me sempre de uma frase do grande mestre, Paulo Freire: O educador deve estar à altura do seu tempo. Pensando nela, eu perdi o medo do mouse, (com a ajuda dos meus alunos), quebrei paradigmas e mergulho na investigação sobre o universo juvenil para fazer uma integração saudável com essa “galera”.
        Mas os desafios são muitos e grandes! Enormes! E é uma busca diária para enfrentar e vencer esses desafios. A alienação, o consumismo, a perda de valores éticos e morais, a falta de hábito e gosto pela leitura, a descrença na sociedade, drogas, a desestruturação familiar, são alguns dos muitos desafios que enfrentamos ao lidar com os jovens em sala de aula e no ambiente escolar.
       Nessa caminhada, felizmente, uma lista interminável de jovens fizeram e fazem história, abrem horizontes, superam desafios a cada dia, “acorda” para a vida e atua de forma adequada na sociedade. A todos eu agradeço de coração, pois isso é a nossa recompensa e a grande fonte de energia para continuar acreditando que um novo mundo é possível.
Desejo que os jovens acolham e participam dos debates propostos em 2013.
E eu, a cada ano, ao deparar com novas turmas, ao sentir e abraçar o desafio de trabalharmos juntos, sempre penso na pergunta que Cecília Meireles faz no final do poema “Estudantes”:
"(...)
As estudantes falam com gestos delicados,
com atitudes de estátua,
enleadas em pulseiras,
e nas mãos, com ideogramas de dança,
            levantam cadernos, esquadros,
            num bailado novo:

           e medem a vida
           e descrevem o universo.

         Que mundo construirão?"

*****

      Deixo aqui um bonito poema do meu queridíssimo ex-aluno, Carlos Henrique, falando do jovem hoje: 


PRÉ - CONCEITO


Um ficar,
Dois "bagunçar",
Três piercings,
Quatro tatuagens,
Cinco malandragens,
Seis maluquices,
Sete vandalismos;
Será que é só isso?

Estamos na política,
Na educação,
Na saúde,
Na contramão...
Sofrendo o preconceito
Da generalização
Da imagem
Do jovem desta geração.

Temos quase tudo.
Mas falta o importante!
Impacto causamos,
A atenção chamamos,
Queremos nosso espaço;
Queremos igualdade,
Queremos de verdade
Ser jovens cidadãos.
Carlos Henrique 2010*


*Carlos Henrique: Estudante de filosofia (PUC-Campinas), um dos vencedores do prêmio “Ser Autor” (SEE-SP – 2010), com poema publicado no Jornal Mundo Jovem- PUC/RS

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

A poesia de Paulo Freire


“De vez em quando Deus me tira a poesia. / Olho pedra, vejo pedra mesmo” (Adélia Prado)

 Mire e Veja:

Grande parte dos leitores desse blog é ligada à Educação. Aqui em São Paulo começa hoje o ano letivo de 2013, e achei oportuno “compartilhar” esse texto. Uma boa reflexão para professores, pais, alunos (as), jovens, todos, enfim... Boa leitura!

A poesia de Paulo Freire
São Paulo, anos 70 
Sérgio Haddad, especial para a FOLHA

        Anos 1960, casa de André Franco Montoro: como aluno do ensino médio do colégio Santa Cruz, fui convidado para uma reunião sobre Paulo Freire coordenada pelo professor Flávio Di Giorgi. Falamos sobre educação libertadora, analfabetismo, diálogo como método pedagógico, relação horizontal entre professor e aluno e conscientização. Ainda não tinha a dimensão da importância daquelas ideias para a minha vida. Mesmo assim, senti um encantamento.
       Final dos anos 60, anos de chumbo: retorno ao mesmo colégio como professor e, mais tarde, como coordenador de um curso popular noturno para trabalhadores jovens e adultos. O curso se apresentou como uma oportunidade para vivenciar o que havia escutado anos atrás, agora em um cenário político de autoritarismo e ausência de diálogo.
        Com uma equipe de professores, pudemos comprovar a força do pensamento de Paulo Freire. Eram ideias simples: dialogar sobre os problemas do cotidiano a partir do conhecimento que cada um trazia; ir atrás das raízes destes problemas; construir alternativas para superá-los; e buscar soluções individuais e coletivas de curto prazo e as de longo prazo.
        Tudo isso chamávamos de conscientização, o que significava descolonizar o pensamento, enxergar a realidade com clareza, superar os problemas a partir da análise sobre suas causas, dialogar para buscar soluções e agir para mudar a realidade de acordo com os interesses do coletivo.
        Como resultado, nossos alunos contavam que haviam perdido o medo de falar para defender suas ideias, que aprenderam a argumentar com seus patrões, que não aceitavam mais piadas racistas ou de quem os diminuía por sua condição social, que não permitiam a violência dos seus namorados e maridos, que não precisavam mais bater nos seus filhos para educá-los e que começavam a se organizar de maneira coletiva.
Aquele pequeno universo escolar de aprender e ensinar para atuar sobre o cotidiano conviveu com o grande universo da sociedade brasileira de aprender e ensinar para agir nos movimentos contra a carestia, pela anistia daqueles que foram obrigados a partir por pensar diferente dos que estavam no poder, nas grandes manifestações por eleições diretas.
        Anos depois, voltei a me encontrar com Paulo Freire, agora como colegas professores na PUC-SP. Comentando a importância de descolonizar o pensamento, contou-me histórias que se passaram com ele, mestre do pensar crítico.
        Paulo morou em Genebra durante seu exílio político. Procurava ser o mais genuíno nordestino nos seus hábitos para resistir ao modo de vida daquela cidade de primeiro mundo. Mesmo assim, nos primeiros dias, impressionado com a limpeza da cidade, comentou, rindo, que se pegou com medo de sujar o corrimão de uma das pontes, de tanto que ele brilhava.
      Mas o mais incrível, continuou, foi que durante os anos em que trabalhou no Conselho Mundial de Igrejas, saía sempre no mesmo horário, tomava o ônibus que passava no ponto em frente da entrada do edifício religiosamente na mesma hora, descia quatro paradas à frente, tomava outro ônibus dois minutos depois e, finalmente, chegava em casa, sempre no mesmo horário. Um dia o primeiro ônibus se atrasou, ele perdeu o segundo e chegou 10 minutos atrasado em casa.
       "O pior, Sérgio, é que eu fiquei indignado! Foi aí que eu pensei que já estava na hora de voltar ao Brasil".
        Hoje, como educadores e educadoras, andamos enredados com ideias sobre ranqueamento de escolas e alunos, avaliações de todos os tipos, nacionalização de modelos internacionais, padronização dos conteúdos, sistemas apostilados, tecnologias pedagógicas, ensino à distância, tablets, multimídias, lousas eletrônicas etc. Que falta nos faz a poesia de Paulo Freire que nos ensinou a sonhar que é possível aprender com a própria vida!

 Fonte: Jornal Folha de S. Paulo – 27/ jan/2013
 * Grifo meu